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Ferramentas de atendimento nutricional em Obesidade

Educação nutricional em grupo para pacientes com excesso de peso e sua efetividade na mudança de parâmetros antropométricos

Nutr. Cristiane Kovacs
Nutr. Monica Romualdo
Dr. Daniel Magnoni

A alta prevalência de doenças cardiovasculares é hoje observada mundialmente. No Brasil, esse grupo de doenças é a primeira causa de óbito, sendo responsável, em 2004, na região Sudeste, por 19.826 mortes de um total de 285.146 óbitos registrados, representando 51,06% do total. Observa-se, também, que o risco cresce progressivamente com a elevação da faixa etária, representando o significante porcentual de 11,24% dos óbitos de adultos jovens entre 20 e 49 anos de idade e de 88,76% dos óbitos de adultos com idade entre 50 e 80 anos.1
Atualmente, vivemos uma situação conhecida como transição nutricional, caracterizada pela inversão da distribuição dos problemas nutricionais da população, sendo em geral uma passagem da desnutrição para a obesidade. Nos países em desenvolvimento, em decorrência da industrialização e da urbanização, houve uma mudança no padrão alimentar da população. O aumento da incidência de obesidade e as mudanças no consumo alimentar são características da transição nutricional e variam de acordo com o desenvolvimento de cada país. No Brasil, as mudanças decorrentes da transição nutricional vêm atingindo intensamente sua população, que passou a consumir em excesso gorduras, açúcares, doces e bebidas açucaradas, diminuindo a ingestão de legumes, verduras, frutas e fibras.2
O conhecimento sobre o que comer é o primeiro degrau na influência do comportamento alimentar saudável. A relação entre o que as pessoas sabem e o que as pessoas fazem tem sido considerada “altamente tênue”. O conhecimento não instiga a mudança, mas funciona como um instrumento quando as pessoas desejam mudar.3 O papel da educação nutricional está vinculado à produção de informações que sirvam como subsídios para auxiliar a tomada de decisões dos indivíduos.4 Um dos papéis do nutricionista é o de ajudar as pessoas a modificar seus hábitos alimentares por meio da assistência nutricional a indivíduos e grupos populacionais.5 A atenção em grupo tem por finalidade promover um ambiente de aprendizado e de troca de experiências capazes de fortalecer o vínculo profissional de saúde-paciente, mobilizando os indivíduos para a busca de autonomia, elevando a autoestima e diminuindo a vulnerabilidade, contribuindo assim para a proteção e o controle de doenças.5
As atividades em grupo desenvolvidas em unidades de saúde são de fundamental importância para se reverter a falta de perspectiva de vida que acompanha muitas pessoas obesas, além de contribuir para a diminuição da demanda por consultas médicas, sendo fator decisivo na adesão ao tratamento.6,7 No que se refere ao atendimento dessa população, é preciso considerar as características da educação de adultos, tendo em vista a importância e a riqueza do processo de aprendizagem que acontece pela troca de ideias, informações, habilidades e experiências.6 No âmbito nutricional, o atendimento em grupo pode ser uma importante ferramenta para o desenvolvimento de hábitos de vida saudáveis, especialmente aqueles ligados à alimentação. Assim nasce o autocuidado, destacando-se o papel da nutrição no estímulo ao aumento do consumo de frutas, legumes, verduras, grãos integrais, à realização de atividades físicas regulares, à troca de gorduras de origem animal pelas de origem vegetal, bem como à diminuição das quantidades de alimentos mais gordurosos, salgados e doces. na dieta alimentar.5

Os pacientes adultos e idosos encaminhados pelos médicos ao ambulatório de nutrição clínica passam por consulta inicial, onde seguem o protocolo. Foram realizadas avaliações nutricionais e antropométricas, prescrição dietética e orientações nutricionais individualizadas a todos os pacientes. Os pacientes eutróficos foram acompanhados periodicamente de acordo com nova avaliação laboratorial, e os pacientes com excesso de peso e obesidade fizeram acompanhamento mensal no grupo de educação nutricional (Figura 1).

O cronograma dos encontros no grupo teve como foco principal a reeducação alimentar e as ferramentas de educação nutricional foram apresentadas aos pacientes por meio de aulas e dinâmicas voltadas à nutrição saudável (Figura 2). Para mostrar a efetividade desse protocolo, foram selecionados pacientes que participaram no mínimo de cinco encontros, dos quais 50, de ambos os sexos, foram incluídos no estudo. Os pacientes foram avaliados no início e no final do protocolo, utilizando-se medidas antropométricas de peso, estatura, circunferência abdominal e índice de massa corporal (IMC). Para a classificação da circunferência abdominal utilizaram-se os pontos de corte propostos pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1997, e para o IMC foram utilizadas a classificação proposta pela OMS, em 1995, para adultos, e a classificação proposta pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), em 2002, para os idosos. Os recordatórios alimentares pré e pós-acompanhamento nutricional foram calculados pelo programa Avanutri®, no qual foram avaliadas calorias, macronutrientes e fibras. Para a análise estatística dos dados utilizou-se o testetde Student com nível de significância de p < 0,05.

Entre os pacientes estudados, 48% eram do gênero masculino e 52%, do gênero feminino. Com relação às características dos pacientes estudados, notou-se que ambos os gêneros apresentaram medidas de alto risco para doença cardiovascular (Tabela 1). Após o acompanhamento, esses parâmetros antropométricos demonstraram redução estatisticamente significante (p = 0,000). Em relação ao peso, houve redução média de 3 + 4,8 kg; consequentemente, o IMC também foi reduzido (p = 0,000)

A circunferência abdominal, um importante preditor para os distúrbios metabólicos e risco cardiovascular, teve redução de 4 + 8,8 cm. Ambos os gêneros apresentaram redução do consumo de nutrientes após acompanhamento: no consumo de carboidratos e lipídeos, os resultados mostraram-se dentro das recomendações, sendo de 55,4% e 28,9% no gênero masculino e de 56,7% e 31,9% no gênero feminino, respectivamente. Houve aumento do consumo de proteínas, provavelmente em decorrência da maior ingestão de proteínas vegetais, com redução do consumo de gordura saturada de 10,8% para 8,9% e aumento do consumo de fibras de 18 gramas/dia, em média. A redução do valor energético total da dieta, antes e após o protocolo, não foi significante, mas mostrou diminuição de 322 calorias no gênero masculino e de 123 calorias no feminino.

A modificação de hábitos alimentares, demonstrada em muitos estudos, tem apresentado resultados positivos, possibilitando observar diminuição dos distúrbios metabólicos e do risco cardiovascular.8

Os pacientes acompanhados por este protocolo foram submetidos a reeducação alimentar e mudanças do estilo de vida, pois, além de possuírem hábitos alimentares inadequados, já apresentavam fatores de risco (hipertensão, diabetes, dislipidemias e sedentarismo) associados ao excesso de peso, com risco ainda maior para o desenvolvimento da doença cardiovascular.
Quanto à perda de peso, a redução foi de cerca de 4%, que pode ser considerada positiva quando comparada a outros trabalhos, que referem ser necessária perda de 5% para obtenção de reduções significativas dos distúrbios metabólicos.8
A intervenção exerceu influência sobre os parâmetros antropométricos dos pacientes, com redução significante dos valores médios da circunferência abdominal e do IMC. Esses resultados corroboram os achados de estudos que demonstram mudanças positivas no consumo alimentar e podem controlar o excesso de peso, sendo importante para a prevenção e o tratamento dessa morbidade. Esses resultados são registrados tanto por intervenções controladas quanto por estudos transversais.9-12
Os pacientes apresentaram pequena redução do valor energético, mas que contribuiu significativamente para perda de peso e melhora do perfil metabólico. A modificação da qualidade da alimentação pode resultar em benefícios a curto prazo em pacientes com alto risco cardiovascular. Um estudo que acompanhou dois grupos durante cinco meses, com pacientes com o mesmo perfil dos pacientes deste estudo, demonstrou melhora da qualidade da alimentação e dos exames bioquímicos.13
Outro estudo demonstrou redução de 3% do risco de Framingham, com acompanhamento durante três anos, avaliado por meio de registro alimentar. Houve redução do consumo energético por meio da diminuição do consumo de gordura saturada e colesterol e aumento de fibras.14
A intervenção nutricional em grupo pode alterar de forma positiva o panorama epidemiológico dos fatores de risco entre os pacientes, sendo, assim, capaz de promover mudanças positivas no estilo de vida, como a melhora da qualidade da alimentação. Para modificar a estrutura da dieta de um indivíduo são necessários programas de aconselhamento nutricional gradativo.4
Os resultados deste estudo são relevantes do ponto de vista epidemiológico e poderão, já que ainda não foram divulgados, representar uma adequada estratégia para redução e prevenção das doenças crônicas não transmissíveis.

O protocolo de atendimento em grupo, com foco na educação nutricional, foi capaz de conduzir o indivíduo a mudanças positivas na alimentação, impactando na redução dos parâmetros antropométricos. Contudo, mais estudos a longo prazo e com amostra maior estão sendo conduzidos por nossa equipe, a fim de mostrar a real efetividade da reeducação alimentar mediante a aplicação dessa nova ferramenta.

Referências

1. Tucunduva S. Pirâmide dos alimentos: fundamentos da nutrição: papel dos óleos e gorduras na alimentação. Barueri: Manole; 2008. p. 275-81.
2. Castro LCV, Franceshini, Priore SE, Pelúzio MCP. Nutrição e doenças cardiovasculares: marcadores de risco em adultos. Rev Nutr. 2004,17(3):369-77.
3. Santos L. Educação alimentar e nutricional no contexto da promoção de práticas alimentares saudáveis. Rev Nutr Campinas. 2005;18(5):681-92.
4. Assis M, Nahas M. Aspectos motivacionais em programas de mudança de comportamento alimentar. Rev Nutr Campinas. 1999;12(1):33-41.
5. Pontes LMB. Por que educar em grupo? Jornal Conselho Federal de Nutricionistas. 2000;2:7.
6. Zukerfeld R. Grupos com portadores de transtornos alimentares. In: Zimerman DE, organizador. Como trabalhamos com grupos. Porto Alegre (RS): Artes Médicas; 1997.
7. Lopes MJM, Silveira DT, Ferreira SRS. Educação em saúde nas doenças crônico-degenerativas e a promoção da qualidade de vida. Estud Interdisc Envelhec. 1999;2:121-30.
8. Willett WC, Dietz WH, Colditz GA. Guidelines for health weight. N Engl J Med. 1999;341(6):427-34.
9. Bo S, Ciccone G, Baldi C, Benini L, Dusio F, Forastiere G, et al. Effectiveness of a lifestyle intervention on metabolic syndrome: a randomized controlled trial. J Gen Intern Med. 2007;22:1695-703.
10. Christ M, Iannello C, Iannello P, Grimm W. Effects of a weight reduction program with and without aerobic exercise in the metabolic syndrome. Int J Cardiol. 2004;97:115-22.
11. Radhika G, Sudha V, Sathya RM, Ganesan A, Mohan V. Association of fruit and vegetable intake with cardiovascular risk factors in urban south Indians. Br J Nutr. 2008;99:398-405.
12. Neumann AICP, Martins IS, Marcopito LF, Araujo EAC. Padrões alimentares associados a fatores de risco para doenças cardiovasculares entre residentes de um município brasileiro. Rev Panam Salud Pública. 2007;22:329-39.
13. Alvarez TS, Zanella MT. Impacto de dois programas de educação nutricional sobre o risco cardiovascular em pacientes hipertensos e com excesso de peso. Rev Nutr Campinas. 2009;22(1):71-9.
14. Bemelmans WJE, Broer J, Hulshof KFAM, Siero FW, May JF, Meyboom-de-Jong B. Long-term effects of nutritional group education for persons at high cardiovascular risk. Eur J Public Health. 2004;14(3):240-5.

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